sexta-feira, 2 de julho de 2010

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        No lugar em que deveria estar o fogão está a máquina de lavar roupas, na cozinha da antiga casa da Paulo Setúbal. Estou lavando as roupas a pedido da minha mãe. Não me sinto a vontade fazendo isso, acho que não sei lavar muito bem. O rapaz chega para me ajudar. Nunca o vi, mas sei que o conheço. Passo a ele o controle da máquina, que manuseia com muita habilidade. Abre a lavadoura de um modo diferente, deixando à mostra, em seu interior, passando por cima das roupas, duas chapas quentes de metal. Sobre elas arremessa quatro grandes e gordurosos hambúrgueres que, automaticamente, começam a fritar, levantando fumaça e espirrando gordura quente para todo o lado. Desesperado, tento impedi-lo de continuar, tento retirar a carne da chapa, peço que pare. Me bloqueia, me ignora, continua seu movimento. Clamo pela Lídia, que vem e nada pode fazer. Minha mãe procura me acalmar e fala, como se quisesse me lembrar, que ele tem problemas de ordem mental. Mesmo estando inconformado com a sujeira e a atitude, sigo em retirada, com o consolo das mãos da Lídia. Paro e olho para trás. Ele, ocupado com a fritura, gira suavemente a fronte em minha direção. Percebo, então, em seu olhar de dor, seus olhos azuis esbranquiçados.

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