22h45. Saída da escola, com meus colegas de classe caminho pelas ruas escuras do bairro. Há uns caras diferentes entre nós. São amigos do meu colega que tem os cabelos loiros compridos e que usa um boné preto. Não confio em nenhum deles. Caminho a alguns centímetros à frente. Conversam baixo, em meias palavras. Precavendo-me, transfiro minha carteira para o bolso dianteiro da calça. Caminhamos... Meu bolso traseiro é atacado violentamente, chegando a levantar meus pés do chão, por um dos estranhos desatento que pretendia roubar minha carteira. Indignado e possuído pela raiva, esbravejo contra o "alemão", acusando-o de ter planejado o assalto. Sua postura e a dos demais confirmam minha suspeita. Discuto com eles num vocabulário malandro. O grupo volta-se contra mim. Pretendem me linchar. Não sou páreo para todos. Adrenado, corro. Escolho direções aleatórias, quero despistá-los. Consigo. Superando o medo e o ódio, tento acalmar minha respiração.
quarta-feira, 26 de maio de 2010
07
Litoral, sol e aventura. Em um Jipe conversível seguimos em estradas de terra, subindo morros banhados pelo mar. Com meu paraglider sobrevoo o límpido verde escuro do mar. Vento na face. Suspiros. Liberdade. Pouso entre surfistas na arrebentação. Noite. Faço uso de uma técnica antiga para escapar dos golpes das ondas. Submerjo e deixo que elas quebrem sobre a minha cabeça. Apesar da habilidade, a frequência provoca-me fadiga, falta de ar. O surfista é ovacionado por um grupo de banhistas (com muitas gostosas de biquíni) que festeja à beira-mar. Um repórter de TV o aborda pegando-o pelo braço para que receba a premiação, que ao meu ver seria uma punição, apesar de não haver motivo aparente. Um jumento faz sexo oral no surfista, que parece gostar da bizarrice. Os dentes do asinino são grandes e fortes, a impressão que tenho é a de que o deceparão. O repórter então o orienta a assumir nova posição e empurra o jumento por trás com suas calças arriadas.
quarta-feira, 19 de maio de 2010
06
O prédio, o apartamento da minha tia Néia na Praia Grande. Eu espero, para descer, o elevador, com o Marcelo. Na sala, eu, a Gabi, a Sushi e um gafanhoto dos grandes, bege, de cabeça redonda, calvo, nariz-de-batata, feições humanas. Como uma montagem em computação gráfica. Ele não é bom. Saltita de um lado para o outro com uma expressão estática, sem esboçar emoção, enquanto a Sushi, em sua plenitude felina, tenta capturá-lo. Com o fim de eliminar a criatura, arremesso fios de arame firmes e pontiagudos contra aquele ortóptero saltador, que se esquiva habilmente. Em meio à luta, noto um pequeno furo no olho esquerdo da gata jorrando um sangue fino e claro. O desespero, o pavor, o arrependimento, a culpa me consomem. Saio em disparada sem direção, aos prantos e berros, fugindo dos sentimentos. Em frente ao posto Esso da Avenida dos Estados, no Bairro de Santa Terezinha, em Santo André, paro ofegante e puno-me em pensamento por mais um erro cometido.
quinta-feira, 6 de maio de 2010
05
PART 1 - Sem nébula
Noite tensa - discussões, explosões... calma. Deito em nossa cama, vamos dormir.
PART 2 - Nébula
De repente o quarto se enche de música. "Inútil Paisagem" na voz de Elis Regina. Pela qualidade do som, distorcido, como um pequeno autofalante com volume saturado, chego a acreditar que provém de meu iPod, que às vezes deixo embaixo de meu travesseiro. Estou assustado.Meu corpo vibra intensamente. Deslizo em direção aos pés da cama em alta velocidade, mas sem sair do lugar. Ela continua deitada ao meu lado, imóvel, ausente aos acontecimentos. Com esforço descomunal, articulo meu aparelho fonador e tento pedir por ajuda. Chamo por minha irmã "M.m.â..gh*.", mas recobrando a paraconciência de que ela não está ali chamo por minha esposa, aproximadamente três vezes. A minha voz é grave, em tom muito baixo, a articulação é rígida e lenta. As sílabas, os fonemas soam espaçados, praticamente inaudíveis em meio ao caos. O desespero cresce. Penso em orar, funcionou outras vezes, mas não me lembro de nenhuma oração. "Pra que tanto céu..." - meu corpo é lançado para o alto e, de costas para o teto, de braços e pernas abertas, gira aceleradamente como uma hélice. Uma voz estranha, macabra, gargalha alto, no entanto mais baixa que a música. A sensação é de que sou alma fora do corpo. A música cessa.
PART 3 - Sem nébula
O quarto é silêncio e breu novamente. Ela serena ao meu lado, minha mão sob a dela.
quarta-feira, 5 de maio de 2010
04
terça-feira, 4 de maio de 2010
03
O Dr. Tufik vai ajudar aquele pai e filho sem lar. Ele, branco, alto, cabelos e barba grisalhos por fazer (há pelo menos uns três meses). O filho, uns nove anos, cabelos lisos castanhos. Estão na rua daquele bairro periférico. No meio da rua. Um pouco mais atrás, o Dr. André observa a movimentação. O pai, aparentemente embreagado, fala alto e gesticula, chuta uma bola sem direção, enquanto o Dr. Tufik com um sorriso de bondade tenta acalmá-lo. O filho olha indiferente e sai pela rua logo atrás à esquerda, seguido pelo seu pai depois de alguns segundos. Saio e volto para casa. É o começo da noite. A casa tem fachada estreita. A entrada possui duas portas, que dão para a rua. A primeira, grades de ferro. A segunda, de madeira, com uma janelinha. Móveis, prateleiras, racks, objetos diversos, livros tomam o cômodo mal iluminado e desorganizado. Divido a moradia com o Paschoal e dois colegas, sendo um deles gay. O colega gay, de toalha amarrada na cintura, acabara de sair do banho. Causou-me certo desconforto, pois o que pensarão de mim se me virem sozinho com um gay semi-nu. Ele me disse que o melhor para desestressar é dar "uminha". Falou isso sem segundas intenções para comigo, mas em tom de conselho. Ele usara da técnica desestressante há pouco. Eu respondi concordando com ar de virilidade excessivo. Ele estava no cômodo três lances de escada abaixo, que era uma garagem adaptada em algo parecido com uma sala e quarto também desorganizados. O Paschoal chegou.
segunda-feira, 3 de maio de 2010
02
Sempre que resolvo me barbear por completo, acertar a costeleta é o maior desafio. O meio da orelha é o meu ponto de referência. Porém, a gilete insiste em passar do limite. Então o lado direito passa a ser referência para o esquerdo o esquerdo para o direito o direito para o esquerdo... Raspei acima da orelha. Como uma entrada de uma maquininha desgovernada. Não foi tão ruim assim.
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